07 dezembro, 2005

Novo Conto

DESEMPREGO
Por Alessandro Buzo

Já fazem 3 meses que acabou o seguro desemprego e nada de Kleber arrumar outra ocupação, e olha que ele procura mesmo, mas além de estar difícil, quando aparece alguma coisa é para ganhar muito pouco e não adianta nada pagar para trabalhar. Kleber mora no Itaim Paulista e paga R$ 300,00 de aluguel, a mulher faz uns bicos em casa de família e tem os 2 filhos pequenos. Kleber faz todo tipo de biscate que aparece, usou suas duas últimas parcelas do seguro para deixar o aluguel em dia e pagar dois meses adiantados, mas agora está chegando a hora de pagar de novo e vai apertar mais ainda. Dia desses depois de uma longa fila na porta de uma empresa ele foi dispensado por ter mais de 30 anos, como pode? 30 anos e não serve mais ? Neste dia seus olhos encheram de lágrimas. A cada domingo o caderno de emprego renova suas esperanças mas não é facil, na segunda para procurar trampo vai dinheiro, a condução está um absurdo de cara, esses dias ele tentou varar o trem e os PFs mandaram ele voltar, muita humilhação, neste dia ele voltou para casa, só tinha R$ 2,10 para voltar, pagando a ida ele ficaria sem nada. Kleber conversa muito com a mulher que lhe pede sempre para não fazer nenhuma besteira, nem pensar em meter os cano nos boy que é pior. Agora chegando a época de natal fica tudo pior, seus filhos de 9 e 7 anos querem o mesmo que as outras crianças, quer o consumismo que é incentivado pela TV, quer panetonne, quer roupa nova e Kleber nada, não arruma nada. Mas sua vida estava prestes a mudar, Kleber pegou um empréstimo para começar com um amigo e montou uma barraca de churrasco na rua, no começo foi meio osso, mas logo que ele pegou freguesia a coisa passou a caminhar, hoje dois anos depois ele não troca sua banca, sua liberdade, sua dignidade por nada. Já mandou a mulher comprar os presentes para os filhos, mandou comprar roupa nova. Nem em sonho Kleber pretende trocar sua ocupação por um emprego de carteira assinada e patrão. Agradece sempre á Deus e a esposa que nas horas mais difíceis foi quem não deixou ele cair em tentação e ir buscar no crime o que a sociedade não lhe oferecia trabalhando. É nesta hora que sem apoio familiar o homem faz coisas que depois, 10 anos preso ele vai ter muito tempo para se arrepender.

ALESSANDRO BUZO
alessandrobuzo@terra.com.br

Um comentário:

  1. Oi, Buzo!!! João Cabral de Melo Neto, a propósito dos 30 anos "que a gente já não serve mais", escreveu:
    Morte e Vida Severina
    (...) A morte de que se morre,
    de velhice antes dos trinta
    de emboscada antes dos vinte
    de fome um pouco por dia.
    De fraqueza e de doença
    é que a morte severina
    ataca em qualquer idade
    e até gente não nascida..."

    beijos...

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Sobre choro e nó na garganta

Trecho do livro "Dente-de-leão: a sustentável leveza de ser" - Escritor Sacolinha