De Aqui de Dentro da Guerra
I - Mataram Francisco
Ah.
Ser protagonista.
Ser um símbolo.
- É mais um ou menos um?
Escrevo pra corromper as estatísticas.
Escrevo para alterar o sentido de estar sozinha.
E Adélia?
Passou
a noite velando o corpo.
- Só tiro de Doze.
E o que dói nem é a morte.
É a guerra.
É somar os corpos e notar
a baixa sempre mais humana.
A última guerra romântica acontece por aqui:
São Paulo, Brasil,
Fundão do Ipiranga
Jardim São Savério
Parque Bristol, Bristão.
Mil e uma noites
a mil.
A milhão.
- Procurou, né mãe?
Ouvi os tiros mas não dei ouvidos.
Morreu alguém. Não fui ver.
É comum.
Era só isso.
De uma festa cantei, dancei, ri
( e isso não é força poética
de quem imita poesia
e põe verbos em paralelismos).
Ri muito a noite toda.
Terminou de madrugada
os tiros subindo a escada:
- Dinha, mataram Francisco.
II -
Daí a idéia de Guerra Romântica: essa guerra cara a cara, mano a mano, de mãos bem maiores que o corpo, de dedos se assassinando. A última não foi a Primeira Grande Guerra. A última é a que acontece por aqui: Que de pequena foi crescendo, pulando os muros dos guetos, se alongando, se multiplicando, como um câncer bem nutrido, como um vírus bem alojado, ora dormindo, ora explodindo, ora abafado, mas nunca inerte. Sempre resistente, sempre bem transmitido pelo contato das mãos, dos olhos, dos pés que se tropeçam, dos namorados e namoradas, do fluxo capitalista, da tela, do maço de cigarros...
III - De Aqui de Dentro da Guerra
De aqui, de dentro da guerra
qualquer tropeço é motivo.
A morte te olha nos olhos
te chama, te atrai, te cobiça.
De aqui, de dentro da guerra
não tem DIU nem camisinha
que te proteja da estúpida reprodução
da fome, da miséria
da ínfima estrutura
que abafa o cantar das favelas
antigas senzalas modernas.
Cemitério Geral das pessoas.
De aqui, de dentro da guerra
eu grito pra ser ouvida.
De aqui, de dentro da guerra
eu me armo e policio.
De aqui, de dentro da guerra
é que eu protejo meus sonhos
pra não virar a cabeça
pra não virar a palavra
pra não virar estatísticas.
Dinha
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Sessão de autógrafos
Escritor Sacolinha lança livro na Bienal de SP na próxima quarta-feira “A Alanda ainda está de pijama” novo livro infantil do escritor s...
-
Neste sábado 13/01 às 10h a Casa de Cultura Pq. São Rafael recebe a terceira edição do projeto Minha Literatura, Minha Vida...
-
Saudações a todos e todas. Este é o Fanzine Literatura Nossa nº 21. Mais um meio de divulgação dos trabalhos literários da Associação Cultu...
-
Currículo/Biografia 1983 Nasce no Hospital e Maternidade Pq. Dom Pedro II, em São Paulo, Ademiro Alves de Sousa, filho de Maria Natalina Alv...
A força das palavras está quando elas começam a provocar mudanças. As palavras quando bem ditas ou escritas, libertam mais de mil braços para reverter e reescrever a história.
ResponderExcluir.
excelente.
.
hábraços,claudio
cARAIO QUE POESIA LOKA. QUEM É ESSA DINHA MANO.
ResponderExcluirMuito, muito bom Maria Nilda.
ResponderExcluirTuas palavras me marcam, lágrimas quase (quase, eu não sei pq as contive, talvez por estar ao seu lado) rolaram e de um dia, a princípio triste, tuas palavras me deram vida, me fizeram feliz.
Parabéns.
Fico muito feliz por te conhecer. Fico muito feliz por poder dividir contigo o poder, o peso, a força de tuas palavras, da tua luz, da tua alegria.
Força sempre.