01 março, 2006

Mais uma...

Bêbados equilibristas
Marco Pezão
O carnaval está por acontecer no sábado, 25 de fevereiro de 2006, com a vinda da banda Radical Livre para tocar na praça Luiz Gonzaga, em Taboão.
Carnaval, mesmo, lembro da infância, começava às sextas feiras e pelas ruas havia cordões de gente fantasiada. As marchas carnavalescas tocando no rádio. Bailes, confetes e serpentinas, cheiro de lança perfume, e a molecada armada de seringas atirando finos jatos d’água.
Compreendi mais tarde que o carnaval era sinônimo de minha liberdade. De cantar, pular, rir, conhecer garotas e fazer amor. Minha mãe dizia que o diabo ficava a solta nesses dias. E que os pierrôs e colombinas teriam o ano inteiro pela frente para se arrependerem. Mas valia a pena arriscar.
Contorno lembranças em volta da praça, os barraqueiros preparam o comércio de bebidas e salgados. É cedo no final da tarde. Mas não tão cedo para o trio de homens que chama atenção a um canto da calçada. Não que estivessem bagunçando, pelo contrário, quietos, praticamente estáticos. Dois deles, horizontalmente de costas ao chão. E o outro sentado na muretinha, observando-os em vago semblante.
Olhares e disfarçados risos acompanham a cena aparentemente imutável. Depois de longos minutos, um deles se curva e estende os braços. O que estava sentado ofereceu as mãos. O esforço foi breve e sem conseqüência, daí o retorno aos pontos de origem.
Os acordes de som preparam a entrada da banda. A cantora que fora do palco não tinha mais que 1m60 e nem aparente sotaque, de posse do microfone se transforma em meio ao jogo de luzes. O axé vem possuído de voz forte, carregado no linguajar baiano. O requebro do quadril no arretado e apertado shortinho jeans amparado em pernas modeladas, não mais modestas, dão a impressão de outra mulher, outra pessoa. Acho que é coisa de artista, mesmo.
E no decorrer de duas horas, a praça se fez lotada e tomada. Eletricamente sintonizada em tantas cabeças a balançar os ritmos mais diversos. Rock, pop, sambas, music, lentas, forró, baião. Batidas de maracujá, meias de seda, capetas, abaxavi, amendoim. Sanduíches de pernil, calabreza, espetinhos e hot dog.
Disposto a tomar uma cerveja fui no bar. Eram três moças, que, ao me verem, uma delas falou: “Tira fotografia nossa”. A outra: ”Dá um real para ajudar na despesa”. E a terceira não disse nada, porém, estava esquisita naquele saiote branco e curto.
Sem dinheiro, mas, gentil. Pedi uma Brahma para dividirmos. Sobre a mais falante, de seios salientes afora da blusinha, conclui: “Impossível serem falsos. É mulher”. A outra é alta, bonita, discreta e melhor vestida. Esboçou sorrisos e me deixou na dúvida: “Será que é o que se vê?” E quanto a que se mantinha calada, tive certeza: “É pura ilusão de ótica”. Voltei à rua, e finalmente a execução da famosa marchinha tornou possível o sábado de carnaval. Enquanto, deitados no chão, os bêbados com braços erguidos e mãos espalmadas pareciam pedir amparo ao mundo girando à volta e acima. Certifiquei, porém, que, imaginariamente, equilibravam bandejas cheias de copos cheios; pois, quase inaudíveis, cantavam “Mamãe eu quero mamar”, diante do companheiro observador.

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